Será
que Deus se sente mais feliz com a fria irrepreensibilidade dos
“bem comportadinhos” ou com a afetuosa efusão dos excluídos e pecadores?
Aliás, os próprios “irrepreensíveis”, se sentem felizes?
Jesus não tinha medo de pessoas mal-afamadas. Conforme o evangelho
de hoje, Jesus aceitou até o carinho de uma prostituta! Enquanto ele
estava, à maneira oriental, deitado à mesa na casa do fariseu Simão,
chegou uma prostituta, regou-lhe os pés com suas lágrimas, secou-os
com sua generosa cabeleira e perfumou-os com o rico perfume, adquirido
com o dinheiro do pecado. Escândalo para a “gente de bem”.
Mas Jesus
aponta o mistério profundo que está agindo por trás das aparências: a
mulher mostrou tanto amor, porque encontrou tamanho perdão! Enquanto o
fariseu não demonstrou carinho para com Jesus, porque achava que nada
tinha a ser perdoado … Jesus explica isso por meio de uma parábola: um
devedor a quem é perdoado muito mostrará mais gratidão do que um que
pouco tem a ser perdoado. Enquanto o fariseu continua “na sua”, a
pecadora encontra a salvação: “Tua fé te salvou” (Lc 7,50).
Há muitas espécies de fariseus, de pessoas satisfeitas consigo
mesmas. Há os fariseus clássicos, os “bem comportadinhos”, que se julgam
melhores que os outros e acham que, por força de sua virtude, eles têm
méritos, direitos e até privilégios diante de Deus. Mas há também os que
acham que sua sem-vergonhice descarada os torna mais honestos que as
pessoas menos ousadas … O filósofo Kierkegaard fala do “publicano” que,
lá no fundo do templo, reza assim: “Eu te agradeço, Senhor, porque sou
um humilde pecador, não como aquele orgulhoso fariseu lá na frente … ”
Cumprir a lei (judaica ou outra) é bom, mas não me livra de
minha culpa. Só Deus pode abolir minha culpa, pois todo pecado atinge
finalmente a ele, nosso sumo bem. Ele aboliu a culpa demonstrando quanto
ele nos ama: permitiu que seu filho Jesus desse sua vida por nós. Este
amor é maior que nossa culpa. Jesus o leva dentro de si. Jesus pode
perdoar o mal que marcou nossa vida. Nós mesmos, não. Só nele nosso mal
encontra perdão.
Quem assim, pela fé, se torna amigo de Deus, porque encontrou em
Jesus o amor, não pode mais deixar de amar. Torna-se outra pessoa. A
graça recebida de graça não pode tornar-se um pretexto para continuar
pecando. A lição de hoje é esta: são amigos de Deus (“justos”) aqueles
que reconhecem diante de Deus sua dívida de amor e dele recebem a
remissão. Então, abrir-se-ão em gestos de gratidão, semelhantes ao gesto
da pecadora.
Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes
(www.franciscanos.org.br)
Nenhum comentário:
Postar um comentário